quinta-feira, 31 de março de 2005

Vidas simples

Durante todo o dia de hoje saltitei entre o escritório e o morangal, entre o escritório e a vinha velha, entre o escritório e as terras que estão a ser preparadas para as vinhas novas e entre o escritório e a adega.
No escritório falei, pessoalmente ou pelo telefone, com várias pessoas. No campo e na adega falei com outras, de outro tipo.

Chegaram de manhã, começaram a trabalhar ainda as gotas de orvalho pigavam das árvores neste dia que amanheceu húmido.
Vinham, como todos os dias, apressados e bem dispostos. Cada um deles seguio para as suas tarefas.
Durante o dia, por isto ou por aquilo, acabei por ter que passar pelos vários locais onde estavam a trabalhar, apressados, conscientes da responsabilidade de cumprir prazos, mas despreocupados, conversas inocentes, riso fácil e franco, gratos por um bocadinho de atenção.
Têm as mãos marcadas pelo trabalho e o rosto pelo Sol e o frio, alguns deles não sabem ler.
Têm vidas pequeninas e simples, limpas como as casas onde habitam.
Têm a paz que a maior parte das pessoas que se atropelam por aí não tem.
Têm uma enorme e contagiante alegria de quem tem tudo o que espera da vida porque não tem ambição, nem vaidade.
A M. deu-me um pão que foi feito por ela para o meu almoço, a B. uma sardinheira num vaso, o J. um queijinho feito com o leite das suas ovelhas. E eu agradeci reconhecida porque sei a importância destes presentes simples.
Já se foram embora para as suas casas, cansados, com a sensação do dever cumprido, sem inquietações. Vão dormir cedo.

Eu hoje ainda tenho um jantar num bom restaurante, tenho pilhas de coisas para fazer antes, tenho que ir a sítios onde tenho que fazer conversa de circunstância, tenho que sorrir polidamente quando nem sempre me apetece.
Deito-me tarde, tenho preocupações académicas, gostos que me levam a gastar tempo e dinheiro em livros, viagens, bilhetes para espectáculos, dúvidas existênciais, falta de tempo...
Às vezes olho para eles e invejo as vidas simples que têm; o tempo, a calma, a transparência, enfim, numa palavra: a simplicidade! E mesmo não me considerando infeliz, nem tendo sequer vontade de trocar de vida, porque a minha vida resulta do que eu sou, às vezes interrogo-me se a felicidade não está mesmo nestas vidas simples.

8 comentários:

alma disse...

Querida Margarida!
Tenho a certeza que a felicidade está nas coisas simples que a vida nos proporciona!
Apenas temos de tornar a nossa vida numa vida recheada com coisas simples!
Na nossa sociedade de hoje perdeu-se o sentido das coisas simples...
e que pena tenho!
Eu tento apanhá-las sempre e aproveitar o máximo do que elas me podem proporcionar!...
BEIJINHOS minha linda
cate

Angel disse...

Com certeza, as coisas simples tem sempre um brilho que nos ofusca as vezes!! Ainda mais quando vivemos atolados numa numa sociedade consumista e futil!!

O bom é não perdermos este "olhar" para a singeleza da vida simples...

bjos e grande xi♥
Angel

Mocas disse...

Todos os dias tento aproveitar as coisas simples da vida, e quase sempre consigo! A única diferença das pessoas verdadeiramente simples, é que o faço conscientemente, porque sei que é aí que reside grande parte do meu equlíbrio. Existe um poema do Fernando Pessoa "A Ceifeira" que tem um pouco a ver com isto das "coisas simples da vida" e o modo como as vivemos.

Bjs

dinorah disse...

E não é uma felicidade teres esses dois mundos aos teus pés? Aproveita a oprtunidade que tens e explora-os ao máximo!!

beijinhos

Vilma disse...

Eu acredito que sim... e acho que tu és priviligiada por poder lidar com pessoas assim e vê-las assim como as vês...um abraço!

Oumun disse...

Não sei que te diga ! Dizes tudo :)
Concordo a 100%
beijocas

Anónimo disse...

O que escreveste demonstra bem quem és, e o teu real valor.
Essas pessoas que descreves reconhecem esse valor e presenteiam-te com o que para eles é valioso.
Um beijinho,
EP

André Parente disse...

Ai, ai, ai... isso é meter o dedo na ferida. "Decide as coisas grandes como se não tivessem importancia nenhuma. Mas vive as mais pequenas como se tivessem toda a importancia do mundo". Não resulta a 100%, mas ás vezes ajuda....