sexta-feira, 10 de agosto de 2007

Luz



A M. - muito minha M. - sente um especial fascínio por máquinas fotográficas, e na segurança surpreendente do seu palmo e meio de gente, aprende à primeira (não sei se aprende ou se adivinha) o modo de operar com a minha máquina (e com o meu telemóvel). A M. dispara centenas de vezes e, a par da predilecção que demonstra por fotografar vezes e vezes repetidas as pessoas de quem gosta, começa a sentir-se, já, atraída por motivos mais abstractos e de entre estes, gosta especialmente de fotografar luzes, nas suas mais diversas formas.


Eu gosto, mas não lhe digo, que ela goste de luzes, porque são o oposto das trevas, porque são o que ela é: a minha luzinha.


A M. é [quase] a única pessoa que consegue que eu me enfiei no aeroporto para a ir buscar quando o corpo, que ainda se sentia dorido, pedia para não sair de casa. A M. tem o poder de fazer as coisas más tornarem-se invisíveis com um sorriso rasgado, uma corridinha na minha direcção e um beijo e um abraço apertado, tão apertado e longo que quase não tinha fim.


A M. faz-me esquecer as horas e o mundo, faz-me rir e ser pequenina como ela. A M. faz-me ser grande, tão grande que sei ser capaz de a defender de todas as coisas más.

A M. é [quase] a única pessoa que consegue que me esqueça de mim, e isso é bom.


A M. não me larga um minuto e, no banco na Igreja, tenta pela primeira vez, entrelaçar os dedos demasiado pequeninos dela, nos meus, aperta com força, leva-me a mão à boca, beija-a, olha para mim com aqueles olhos enormes, doces e suplicantes e cola-se a mim como um gatinho, e eu, de coração apertadinho e olhos rasos de lágrimas, prometo a Deus e a mim mesma que sim, que não vou fraquejar nem desistir e que vou sempre, sempre estar ao lado dela.


O meu primo diz que é a química, a aponta para as veias do braço, como quem diz que é a química do sangue. Será. Será também, mas somos só primas, e eu só sinto isto por ela.


A M. faz-me ter força suficiente para correr pelo aeroporto com ela ao colo, numa corrida contra o tempo para não perder o avião, obriga-me a cerrar os dentes para não chorar na despedida e deixa-me com o seu boneco nos braços e o coração a doer já de saudades.

Não há volta a dar, o amor dói sempre, simplesmente porque é muito maior do que o coração.