Era sempre dito com a naturalidade de quem reconhece que, malucos, somos todos um bocadinho. Quem é que não tem uma ou outra mania?!
Mas eu tenho várias!
Uma delas é, francamente, estranha. Gosto de áreas de serviço. Sim, de áreas de serviço, das autoestradas.
Desenvolvi esse gosto quando comecei a gostar de aeroportos; que o mesmo é dizer que foi quando comecei a gostar de viajar, porque de aviões, propriamente ditos, não gosto.
Ora, à falta de idas e vindas de aeroportos, sempre existe aquilo que, a mim, me surge como o substituto mais próximo: as áreas de serviço.
Não gosto da comida. Nada!
Mas até nisso me lembra um aeroporto. É que a comida de avião, enfim...
Mas agradam-me outras coisas.
Depois de oito horas sem comer até me pareceu uma boa ideia as almôndegas mornas com esparguete cozido há horas.
Apercebi-me muito por alto da conversa da S. acerca da festa de anos dela (à qual não posso faltar!), do riso do P. a cada palavra dela e dos pontapés que o L. me deu por baixo da mesa por perceber que estava noutra dimensão. E estava mesmo.
Estava num sítio fora das referências normais.
Não pertence a lugar nenhum. Não é destino de ninguém.
Ninguém lá permanece, toda a gente está de passagem. Ninguém pertence lá.
Cada uma das pessoas que lá estão tem histórias diferentes, destinos diferentes, origens diferentes. De comum apenas existe o facto de coincidirem ali, num momento mais efémero do que qualquer momento, por defininção, forçosamente é.
Todos estão a ir ou a vir de algum lado.
Estava distraída a tentar perceber que tipo de pessoas lá estavam.
Um casal de estrangeiros de meia idade, talvez holandeses; um homem novo, sózinho, com ar de quem se sentia asfixiado mas não pela gravata que usava; cinco espanhóis barulhentos como é normal, turistas evidentemente; um casal novo com uma pequenita de caracóis largos, já quase adormecida encostada à mãe; e um outro casal com ar de quem não queria continuar viagem nenhuma em conjunto.
Não resisti à velha tentação de tentar reconstituir, mentalmente, a vida de cada uma dessas pessoas.
Mais um pontapé, um olhar inquisidor e a pergunta: Onde é que andas?, fizeram-me voltar ao resto das almôndegas.
Levantei-me e fui comprar pilhas - também nisso se parece com as lojas dos aeroportos.
Saímos, como toda a gente, para continuar viagem. Como toda a gente, não tinhamos nada que nos prendesse ali. Aquele lugar não tem importância, nem identidade, nem faz parte de nada, a não ser de um instante na viagem de cada um. É isso que me agrada neles.
E lá voltamos à autoestrada e ao CD dos Coldplay, porque aquilo é só uma paragem rápida, fora do espaço e do tempo.