sábado, 14 de outubro de 2006

Certezas

Almocei com uma amiga. Falámos, muito. Como convém, que já que somos mulheres e que temos a fama, ao menos que tenhamos o consolo de a merecer.
Sorrisinhos, gargalhadas sonoras, olhares apreensivos, suspiros, caretas... surgiam de acordo com os assuntos que variavam depressa.
No meio de conversa fluída, leve, bem disposta, como o dia de Sol lindo que tivemos hoje, lá surgem as outras. Daquelas de outro tipo, daquelas em que baixamos um bocadinho o tom, falamos mais devagar, olhamos mais fixamente para a pessoa com quem falamos. Confissões. Ou confidências.

Ouvia-a. Tinha-me pedido para almoçar com ela porque não tinha querido ir almoçar com ele e a mãe dele.
Sogras!!! Dizia-me ela. Que são todas iguais. Bicho mau, ao cimo da terra, que servem apenas para estragar o que podia ser perfeito.
Mas não a conhecia, a ela, à dita sogra. Nunca a tinha visto, nunca lhe tinha ouvido a voz, nunca, sequer, viu uma fotografia dela. Mas não podia ser boa!
Disse-lhe que talvez estivesse errada, que percebia um certo receio, mas que talvez não fosse assim. A palavra assusta, mas o que ela é é mãe dele, criou-o. Criou-o uma vida inteira e depois... há-de vê-lo seguir o seu caminho com outra pessoa que, naturalmente, gostará de saber que gostará dele assim de uma forma incondicional, que o ampare, que o compreenda, que o alimente capazmente, que...
Disse-lhe que acho até que podiam ser muito boas amigas, já que em comum têm uma coisa muito importante: o enorme afecto por ele. Que, se calhar, ela devia sentir-se eternamente agradecida a essa sogra porque, afinal, se não fosse ela, ele simplesmente não existia.
De qualquer modo, sogras, são pessoas e, como tal, há-as boas e há-as más. Só isso.

Sorriu e disse que era por isso que gostava de me ter como amiga. Que a ouvia e compreendia, mas que tinha sempre a certeza do que era certo.
Nada mais errado!!! Completamente!
Não tenho certezas de nada!

Já tive. Já tive muitas certezas, que se esfumaram. A vida levou-as numa altura em que levou outras coisas, e eu nem tinha percebido que não as tinha já.
Levou-as, e quando olhei para o lado à procura delas, reparei que não estavam lá, e que me sentia perdida, que não me conhecia já, que... precisava de um tempo para me encontrar de novo.
E encontrei. Pelo menos um bocadinho.
Às certezas, não vi mais. Pensei, durante este percurso, que voltaria a encontrá-las. Não as mesmas, mas outras. Mas não.

Das primeiras fiquei a saber que não eram verdadeiras. Das segundas... não fiquei a saber nada.
Sei que sentia necessidade delas, de ter algumas, que chorei por elas e que, depois de gastas as lágrimas e as forças para protestar, lá vinha um novo dia em que aprendia a viver sem elas e a aceitar só o que a vida me dava. Coisas boas, na sua maioria, mas sem as tais certezas.
Não, não tenho certezas - a não ser de coisas fundamentais - e aprender a viver sem elas foi a lição mais difícil da minha vida.
É por não as ter que fui obrigada a ser mais ponderada (...pois..., deixei de atirar coisas às paredes!).
Viver sem certezas, ter de as procurar em cada momento e não as ter como um dado adquirido e universal, foi como aprender a andar de bicileta sem rodinhas. Só que é mais difícil e demora mais e como esta nova Margarida ainda é uma menina, de vez em quando desiquilibro-me ( às vezes, desiquilibro-me mesmo muito e chego a esfolar um joelho) e preciso que me segurem a bicicleta para continuar (sim, calha-te quase em exclusividade a ti, menino, mas também foste tu que deste o principal impulso para que, na altura, me sentisse suficientemente segura para andar sem rodinhas. confesso que pensei que seria mais fácil... mas, obrigada!).

Certezas?! Não, não as tenho.
É por isso que tenho mais atenção aos pormenores, à vida... é por isso que aprendi que as coisas não são sempre brancas ou pretas. Há tantas cores por aí...

10 comentários:

Sara MM disse...

são mesmo muito raras a coisas sobre as quaos se podem ter certezas... já convicções, opiniões, essas até dão jeito...

BJss

Clara disse...

Eu não acho, Margarida. Eu não vejo as coisas assim. Perdeste as noções que formatavam a tua vida desde que nasceste, com as quais te era mais fácil conviver (pelo hábito), mas que afinal não eram mais do que as certezas de outras pessoas. Quereres procurar outras formas de ver as coisas é um passo muito grande mas essencial (e tenho a certeza que consegues fazê-lo sem ajuda). Se há uma certeza que ganhei em toda a minha vida é de que a única pessoa que pode segurar a bicicleta somos nós próprias (não desprezando ajudas, claro). E que o único caminho que vale a pena percorrer em cima dessa bicicleta é o que nós encontramos, não o que vem assinalado em mapas. Beijinhos, e claro, gosto de ter ler como sempre.

Clara disse...

Emma, Emma, que saudades, já tinha pensado em ti muitas vezes!

gralha disse...

Ai as certezas, as certezas... Há meia dúzia delas de que não consigo abdicar, acho que ainda nõa cheguei a esse ponto de maturidade.
Quanto à tua amiga, como gostava de falar com ela! Eu bem tento não implicar com a minha sogra mas é mais forte que eu ;)
Beijinhos!

Ana disse...

Isto, eu sei de certeza, sogras nem ve-las pelo menos a minha, aquela mulher eh as 7 pragas do deserto numa soh pessoa.

Ana disse...

Tanta dor que sinto por detras das tuas palavras.
Sera que estou enganada?

Margarida Atheling disse...

Ana: tanta dor não. Já existiu, sim. Agora essa dor desapareceu (há tempo já).
Mas sensibilidades pequeninas temos todas todas nós, mulheres. E há dias, ou alturas, em que elas estão mais à flor-da-pele.
Azar o teu com a tua sogra, hein?! Mantém a distância! ;)

Margarida Atheling disse...

Ana: tanta dor não. Já existiu, sim. Agora essa dor desapareceu (há tempo já).
Mas sensibilidades pequeninas temos todas todas nós, mulheres. E há dias, ou alturas, em que elas estão mais à flor-da-pele.
Azar o teu com a tua sogra, hein?! Mantém a distância! ;)

Unknown disse...

Mas alguem consegue hoje em dia ter certezas de alguma coisa na vida???
Tenho uma amiga que diz "O que hoje é, amanhã poderá não ser", o que é uma grande verdade!!!

A única coisa realmente certa é mesmo a Morte... essa sim... todos passamos por ela um dia...

Em tudo o resto, devemos tentar levar, viver o dia a dia!!!!
Uns dias melhores que outros, mas faz parte... é a vida!!!

Bjs

Rui disse...

Lá fora está cinzento. Muitas vezes, cá dentro, também. Não tem que ser mau.