terça-feira, 27 de fevereiro de 2007

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Lá em baixo, na garrafeira há várias garrafas. Lembro-me muito bem de, na adolescência, me madarem descer as escadas ingremes que dão acesso à garrafeira com o chão de xadrez e traves de madeira no tecto, à garrafeira iluminada apenas por um pequeno óculo e cheia de teias de aranha e com pó de muitos anos acumulado nas garrafas, silenciosamente arrumadas em grupos, maiores ou mais pequenos.

Algumas dessas garrafas têm rótulos comerciais, como qualquer garrafa que se compra nos locais previsíveis, outras, em grupos sempre mais pequenos que as anteriores, têm rótulos manuscritos com data de colheita e pouco mais. Mas existem outras. Existem garrafas sem rótulo algum, sem nada que as identifique ou diferencie. Estão lá apenas. Mais isoladas do que as outras, quase sempre com mais teias de aranha e mais pó.

Mandaram-me lá, já lá vão muitos anos, descer e ir buscar uma dessas garrafas sem rótulo, e lá fui, como que tele-guiada pelas informações precisas que me tinham dado. Não tinha rótulo, mas sabiam que existia, sabiam exactamente onde estava. Não tinha rótulo mas estava mais diferenciada do que as outras. Não tinha rótulo mas valia mais do que todas as outras.
Era por isso que não tinha rótulo: era única e inconfundível.

Mas eu precisava de rótulos nas minhas coisas. Durante anos e anos, desde que tenho consciência de mim, guiei-me primeiro pelos rótulos que os outros tinham posto, depois fui adquirindo a capacidade de, também eu, pôr rótulos. Rótulos nas situações, nos sítios, nas pessoas, nas prioridades... Rótulos em tudo. De cores diferentes, arrumados por categorias, tão completos quanto possível, com ano de colheita, instruções para uso, análise química dos componentes...
Tentava diferenciar tanto quanto possível. Eram rótulos muito completos para tentar evitar cair no facilitismo reductor de generalizar e agrupar coisas demasiado diferentes. Mas eram rótulos.

Por isto ou por aquilo... não importa porquê, na garrafeira que é a minha vida, apareceram garrafas dessas, dessas sem rótulo algum.
Não sabia o que fazer com elas. Quis inventar, insistentemente, um rótulo qualquer que lhe pudesse colar, mas nenhum servia. Nenhum.
E então?? Deitava as garrafas fora? Mas se elas, como as da garrafeira de verdade, eram mais valiosas do que as outras com rótulos? Se eram únicas... não precisava de lhes por um rótulo para saber que o eram e que não se confundiam com nenhuma outra.
Guardei-as assim.
Mas depois... depois... vi mais. Vi que os rótulos que tinha colado nas outras garrafas estavam, em alguns casos errados. E arranquei uns quantos.

Não sei quanto tempo vou conseguir viver sem os rótulos no que me rodeia, não sei se não darei mau uso às coisas por não estarem devidamente rotuladas, não sei se não misturarei algumas, não sei se não cometerei erros, não sei se não me arrependerei de fazer uma coisa que comporta bem mais riscos do que seguir as intruções lineares contidas nos rótulos, não sei se conseguirei gerir por muito tempo situações para as quais não encontro livro de instruções, não sei se de um momento para o outro não me vou sentir perdida no meios destas coisas... mas apetece-me que seja assim, apetece-me descobrir sentidos novos para palavras que usava antes em contextos diferentes, e palavras novas para coisas que, afinal, não se adequam às que lhes tinham sido atribuidas. Agrada-me, até, não encontrar palavras para algumas coisas. E ainda que não me agradasse... não seria por isso que as coisas seriam diferentes.
Não sei por quanto tempo será assim, mas agora é. Agora é... e está um dia de Primavera lindo, lindo!

sexta-feira, 23 de fevereiro de 2007

Azul

Devia chamar-lhe O primeiro passo, mas chamei-lhe azul. Porque foi a primeira coisa que me ocorreu e no meu blog mando eu (ao menos nisso).
Azul, límpido e alegre, do céu. Azul, infinito, do mar.

Não me surpreendi com o mail/convite para o lançamento do livro. Sabia que ele iria, mais cedo ou mais tarde, escrever um livro sobre as suas viagens. E sobre as outras viagens que ele, como muitas poucas pessoas, consegue fazer, dentro destas viagens.
Não me surpreendi mas fiquei com um sorriso levemente apatetado, feito de auto-satisfação por ter razão em alguma coisa, e , mais ainda, por ver um amigo seguir o caminho que lhe imaginavamos próprio.

Podia falar do sorriso amável que tem, da sua boa disposição... podia falar do autor, mas não seria por isso que recomedaria o livro a ninguém.
Claro que me agrada poder dizer: aqui está uma das pessoas de quem gosto. Mas isso é comigo.

Durante algum tempo (não me recordo ao certo quanto) ele foi uma janela aberta para mim, onde ia respirar e espraiar os olhos por praias de outros continentes, aldeias perdidas, pessoas únicas... durante esse tempo, que já não me recordo quanto, ele deu-me as asas que não tenho (ou não tenho coragem de usar) e levou-me, a mim e a quem o acompanhou, por continentes diferentes e mundos cheios de emoções, aventuras, sol, areia e salpicos de mar.

Levava-nos com ele, pura e simplesmente. E mostrava-nos o mundo visto pelos seus olhos e pela sua alma.

Durante esse tempo, isso aplacou-me muitas vezes a necessidade de espaços mais amplos e mais longínquos.
Sabia que o Kwan, que é o André, haveria de dar O primeiro passo, nesta viagem também. E recomendo o livro, pois. Recomendo-o sem o embaraço de me sentir a fazer favores, recomendo-o porque ele escreve como sente e nos dá asas, ao levar-nos com ele.

Não vou estar na Fnac do Norte Shopping, no dia 2 de Março. Não vou, porque não posso.
Mas vou comprar o livro aqui e terei tempo suficiente para reclamar o autografo.

terça-feira, 20 de fevereiro de 2007

Café com leite

Foi o meu jantar. Um copo alto de café com leite.
Era o que me apetecia, e a prova que me soube pela vida é que me mereceu um post.

Não fiz metade do que tinha planeado fazer. Mas jantei café com leite e nada me teria sabido melhor.

domingo, 18 de fevereiro de 2007

Fadas, princesas e bailarinas


Todas as meninas são. É sabido que todas as meninas são bailarinas. E, todas as meninas, são também fadas e princesas.

Por esta época as meninas vestem-se de fadas, de princesas e de bailarinas. Vestem-se porque são livres para escolher ser o que querem ser. E aquilo que querem ser, é o que realmente são.

Eu também usei, há anos, tiara e um vestido cor-de-rosa, até aos pés, com rendas brancas. Também usei chapéu de bico e varinha mágica com uma estrela na ponta. Também usei saia de tule e sapatilhas.

Depois, crescemos e deixamos de usar estas coisas. Mas continuamos, de algum modo, pela vida fora, a fazer vénias delicadas e a usar tiaras; a usar passes de mágica; e a pormo-nos em pontas e a fazer pliés e demi-pliés.

As meninas, pequeninas, ainda não sabem que o são.
Nós, crescidas, já não nos lembramos disso.
Mas todas as meninas são fadas, princesas e bailarinas.

sexta-feira, 16 de fevereiro de 2007

Deadline

Não sei quem inventou esta expressão, mas foi, certamente, alguém com um sentido muito apurado da realidade (além de muito espirituoso, está claro!).

Deve ser a expressão em que, por estas alturas, tenho tropeçado mais vezes.

quinta-feira, 15 de fevereiro de 2007

Valença


Pudesse eu... e atirava umas peças de roupa para dentro da mala e ia. Ia e matava saudades do sítio, das pessoas, dos sons.
Pudesse eu... e acordaria, outra vez, nestes dias com o som dos sinos da Catedral de Tuy, lá, ali mesmo do outro lado do rio.
Pudesse eu... e ia.
E ia também a Melgaço, e à Lapela, e a Monção, e a Caminha, e ia a Tuy, e subia ao Monte de Santa Tecla, e ia a Vigo e a Santiago, porque tenho saudades. E ia ao meu sítio preferido.
E aproveitava todos os minutos, porque o tempo é sempre curto.
Pudesse eu... tirar quatro dias ao que tenho por fazer.
Pudesse eu...

quarta-feira, 14 de fevereiro de 2007

Post sem o mínimo interesse

Há muitos anos que sou fiel às lapiseiras da rotring.
Às lapiseiras e às borrachas.

Perdi a borracha.
Perdi também a lapiseira.
Perdi a esperança de as encontrar.

Na papelaria não havia dessas. Estavam esgotadas.
Comprei uma lapiseira da staedtler e duas borrachas, branquinhas, como as outras, mas de marca branca.

Picuinhas, eu sei!
Não ligo nada a marcas. De nada. Mas sou muito fiel às mesmas lapiseiras, canetas e borrachas.
Vamos ver como me vou dar com esta.

segunda-feira, 12 de fevereiro de 2007

Note to self [and another person]

Esta notinha era necessária. Nem é que me apeteça fazê-la, mas é-me necessária.
Aquela passagem mais amarga, contida num post (o quarto abaixo deste), tinha origem numa pessoa precisa, num acontecimento determinado.
Tudo o resto, se mantém. Tudo o resto existe por si mesmo. Tudo o resto é verdade e tem o valor que tem.
Não aquilo!

Porque, às vezes nos enganamos, inevitávelmente. Porque nos enganamos porque tem de ser assim, porque o que está ao nosso alcance para avaliar uma situação nos empurra, obrigatóriamente, para uma determinada conclusão.
Porque, posto isto, tinha batido com a porta. Ruidosamente. Absolutamente determinada a não a voltar a abrir. Fechada e trancada. Porque desta vez já não chorava, não valia a pena, estava decidida. Mas estava enganada ao fazê-lo.
Porque não era verdade.
Porque as evidências enganam!

Porque hesitei até me dispôr a falar. Porque fui fria, irónica, distante, quase implacável. Porque, desta vez o fui, porque o ataque é a melhor defesa.
Porque se ele não tivesse insistido as coisas tinham ficado assim mesmo, e não deviam.
Porque lhe disse coisas horríveis, porque dissemos muita parvoíce um ao outro, porque desconversámos mais do que conversámos durante o que me pareceu uma eternidade e porque, alguma coisa, nessa altura, por mais que nada do que era dito fizesse qualquer sentido, já me tinha feito perder a coragem para manter a porta trancada.

Porque no meio daquilo que me parecia um absurdo - desesperadamente absurdo - começava a pressentir, mais do que a ver, uma vontade das duas partes, mesmo que desajeitada, de esclarecer as coisas, e isso só podia ser bom. E parece que funcionou, parece que nalgum momento consegui explicar-me, ou ele entender-me. Porque um: tens razão. desculpa!, resolveu tudo e deitou por terra todos os problemas.

Porque falar é sempre melhor do que calar. Sempre.
Porque por mais falta de jeito que descobramos em nós nestas alturas, se deve tentar e tentar e tentar... até nos tornarmos claros e até percebermos a outra parte. Porque às vezes estamos tão, tão perto de termos a mesma posição e achamos que estamos tão longe.
Porque quando se gosta das pessoas não podemos fechar portas unilateralmente, e porque há sempre coisas boas... mesmo no meio de uma tempestade!

Nota: o post segue, propositadamente, desta vez, sem comentários porque se trata, de facto, de uma note to self [and another person]. Mas pensem duas vezes antes de "fechar portas".

?!?! # 2

E depois do sismo que, afinal, existiu mesmo (pelo menos fico mais tranquila quanto à minha sanidade mental) as musiquinhas do costume, no posto de rádio do costume, um comum posto que emite em FM, as musiquinhas, dizia eu, estão a ser interrompidas por umas emissões esquisitas cheias ruído de fundo, com uns senhores a falar de uns códigos com muitos números, tipo coordenadas de aviões e a única palavra que consegui distinguir (excepto as coordenadas) foi Toronto!
Será que o mundo está no mesmo sítio?!
Que começo de semana...!!

?!?!

Era capaz de jurar que houve um tremor de terra!
A cadeira abanou, e muito! E eu fugi para a rua.
Ou estou a perder o juízo ou... houve um tremor de terra.

domingo, 11 de fevereiro de 2007

Storm

Imagem daqui

Bom, jantar com Amigos, mesmo, de verdade; rir e falar e rir e cantar e rir, e não conseguir, de vez em quando, segurar uma lágrima mais teimosa, mas rir na mesma até quase de manhã, e sentir-me bem e aconchegada por isso, por eles.
Bom, querer aproveitar todos os minutos e que a noite durasse uma eternidade.
Bom, ter pessoas assim, com quem podemos contar sempre, mesmo quando não lhes demos a atenção devida, mesmo quando não são eles a causa das nossas tristezas.
Bom, estar com eles, e eu já quase não me lembrava. Ou, até acho que nunca tinha sabido de verdade.
Bom, acordar perto do mar.
Bom, sair e apanhar o vento forte; forte, para levar as coisas más.
Bom, ver o mar bravo que acalma a alma com uns salpicos na cara e o barulho das ondas.
Bom, os cabelos em desalinho por causa da mistura do vento, do chuvisco, dos salpicos do mar...
Porque há sempre coisas boas... mesmo no meio de uma tempestade!

sábado, 10 de fevereiro de 2007

Ela

Ela não sabia, e continuava a não perceber, porque insistiam com ela para ir com eles a jantares e festas e a saídas à noite e ao cinema e a idas à praia, mesmo que no Inverno, nem porque lhe telefonavam tantas vezes, mesmo que a resposta que lhe saísse a estes convites fosse, quase invariavelmente, um não.

Ela não sabia, e continuava a não perceber, porquê que continuavam a insistir, porquê que não se esqueciam, ou não se cansavam de querer a companhia dela.

Ela não sabia, e continuava a não perceber, mas achava agora que o critério para escolher com quem ia sair podia, e devia, mudar e que aquilo que fazia sentido era passar o tempo com as pessoas que, óbvia e realmente, queriam a sua companhia, que tinham querido, continuavam a querer, e para quem não tinha sido um capricho de que se tinham cansado, em suma: com as pessoas que a queriam, apesar da indisponibilidade que quase sempre exibia.

quinta-feira, 8 de fevereiro de 2007

Quelqu´un m´a dit

On me dit que nos vies ne valent pas gran chose
Elles passent en un instant comme fannent les roses
On me dit que le temps qui glisse est un salaud
Que nos chagrins il s´en fait de manteaux

Não é língua que domine, mas também não foi preciso recorrer ao dicionário para entender a letra. E ainda que não a entendesse... não era preciso. Porque não é mesmo o mais importante nela.

Perfeita!
Para se ouvir numa noite de vento e chuva, numas águas furtadas aquecidas, para estar mais perto do céu.
Envolvente, límpida, transparente, doce. Rodeia-nos de mansinho e parece que desliza pela pele, fecha-nos os olhos, entra-nos na alma, controla-nos a respiração e toma conta de nós.
O resto... Mas ainda existe algum resto?!
Que bom que ma mandaram!

Assim, meia, meia

Dói-me a cabeça. Também estou assim meia enjoada, meia sem apetite, meia sem sono, meia com vontade de dormir.
Meia indecisa entre tentar ler um bocadinho (livros técnicos!), meia sem saber se devia era ir deitar-me mais cedo.

Entretanto, vi, mais ou menos, o telejornal, enquanto tentava comer um meio jantar.
E enquanto via bocadinhos de notícias sem prestar atenção nem bem ao que via, nem bem ao que comia, vi as imagens da neve em Londres, e vi uns miúdos deitados num trenó, alegremente, encosta abaixo.

Então lembrei-me que em pequena tinha um cavalo de baloiço. Adorava-o! Não passava um dia sem ele. Até foi necessário reforçar aquela parte de madeira que tocava no chão, de tanto uso que lhe dava.
Eu gostava muito do cavalo. Mas também gostava muito de neve. Então, repetia vezes sem conta, durante uns dois ou três anos, com um desembaraço que gostava de não ter perdido, e uma segurança de quem não sabe o que são dúvidas ou impedimentos, que aquela parte de baixo do cavalo, aquelas barras arqueadas que o suportavam e que o levavam a balouçar tinham de ser tiradas para servir de trenó.
Caramba! Era muito mais determinada e muito mais engenhosa! Naquela altura sabia aproveitar todas as potencialidades das coisas, não tinha hesitações, era persistente e não havia cá meias tintas!

quarta-feira, 7 de fevereiro de 2007

Alecrim

Alecrim, alecrim aos molhos, por causa de ti, choram os meus olhos
Alecrim, alecrim aos molhos, por causa de ti, choram os meus olhos

Ai, meu amor, quem te disse a ti, que a flor do campo era o alecrim?
Ai, meu amor, quem te disse a ti que a flor do campo era o alecrim?

Alecrim, alecrim doirado, que nasce no monte sem ser semeado
Alecrim, alecrim doirado que nasce no monte sem ser semeado

Ai, meu amor, quem te disse a ti, que a flor do campo era o alecrim?
Ai, meu amor, quem te disse a ti, que a flor do campo era o alecrim?

A M., que ainda trabalha cá, embalava-me nos seus braços, dolentemente, enquanto cantava esta canção simples, repetitiva.
Lembro-me do aconchego dos braços dela, da toada da sua voz, do balanço doce com que tentava adormecer-me à sesta. Acho que é por causa disto, por causa destas recordações, por causa dela, que, este ano, tanto tempo depois de deixar de ser pequenina e tanto tempo depois de não haver lugar nem pessoas para isto na minha vida, me soube tão bem, apesar de tudo, voltar a ser embalada.
Mas, aqui entre nós, não é canção que se cante a uma criança pequena.

Hoje, apararam a sebe de alecrim, e eu fiquei assim, com alecrim aos molhos.
Enchi as jarras que existem pela casa e guardei todo o outro, que sobrou, numa casa de apoio do jardim. Agora, que começou a chover, apetecia-me fazer dezenas de saquinhos para o guardar lá dentro e distribuir por todas as gavetas. Apetecia-me, mas o tempo não deixa.

terça-feira, 6 de fevereiro de 2007

Senhora das minhas horas [ou o contrário]


Até ao último dia de Março, os horários, salvo reuniões ou compromissos inadiáveis, são por minha conta. Sou eu que faço a gestão de cada minuto do meu dia.
Por isso, pude hoje, depois de perceber que não adiantava nada estar sentada ao computador, sair de bicicleta de manhã.
Por isso pude sair e respirar o ar frio da manhã, senti-lo na cara e nas mãos, pisar o orvalho nas ervas, tirar umas quantas fotografias de pássaros e de flores e dos cães, chegar cansada, com uma sensação estranha nos músculos (mal habituados que estão!), tomar um duche, rir-me de mim mesma por, ao passar os dedos nos cabelos para os desembaraçar, reparar que, de tanto brincar, não consigo deixar de chamar ameaçador ao amassiador desde o Verão.
Acho que isto faz de mim, como me disse uma amiga minha, senhora das minhas horas.

Mas depois... sentei-me, com um sentimento de resignação (pouco resignada).
Tudo para fazer. Tantas coisas!
Tempo nenhum é meu. Cada hora me faz falta. Não há hora para acabar o trabalho. O trabalho não acaba.
Quando temos um horário, o tempo que sobra dele, é nosso. Quando não o temos... todo o tempo nos faz falta, todo ele é roubado ao que há por fazer.
Ao serão... deviamos, pelo menos, alinhar as coisas para o dia seguinte. Ao fim-de-semana deviamos, pelo menos, pôr em dia o atraso que se vai acumulando ao longo da semana. E nunca como agora me apeteceu tanto aproveitar os serões e os fins-de-semana para aquilo que é suposto eles existirem.
Senhora das minhas horas?? Eu?! Bem pelo contrário...!

Mas sim, dei uma volta de bicicleta de manhã e, enquanto isso, não pensei no trabalho!

segunda-feira, 5 de fevereiro de 2007

Vermeer

Gosto, e pronto!

Não sou especialista em nada, nem queria ser! Mas gosto de algumas coisas.
Gosto de pintura, gosto de música, gosto de poesia... mas não percebo nada. Não me peçam para eleborar teorias acerca de nenhuma destas coisas.

Não me obriguem a ler pautas, não me falem na métrica dos versos, não me falem em escolas de pintura.
Obrigatóriamente, aprende-se umas coisas, em casa, com a família, com amigos, no colégio, na faculdade, em viagens, em exposições, no que se lê, no que se ouve. Aprende-se mas conta tão pouco.

Nestas coisas faço mesmo questão de não analisar, de não querer saber porquê que gosto, porquê que é bonito. Não quero porque isso mata metade da magia, dessa graça que é gostar, de gostar só, com os sentidos e com a alma, e não com os parâmetros de análise inventados pelos críticos e pelos académicos.
Disfrutar mesmo é gostar e não saber porquê, nem querer saber.

Gosto do Vermeer, e pronto!
Gosto muito.
Sei quem era, onde viveu e quando. Sei mais umas coisas. Mas isso não importa nada.
Gosto! E o post podia reduzir-se a uma só palavra, porque todas as outras são dispensáveis.
Gosto!

quinta-feira, 1 de fevereiro de 2007

Verdades

Imagem daqui

Uma pessoa ligada aos cavalos contou-me, há anos, que existe um provérbio num país, do qual não me recordo o nome, que diz que devemos soltar um cavalo, se ele voltar para nós é porque é nosso.

Faço isso muitas vezes com a minha égua: solto-a.
Ela sai a galope, num galope alucinante. Sacode as crinas, dá saltos e afasta-se a uma velocidade vertiginosa.
Da primeira vez fiquei com o coração nas mãos, vi-a afastar-se sem parecer dar o menor sinal de abrandar e muito menos de querer voltar, vi-a afastar-se tanto que não sei me ouviria chamá-la. Mas voltou. Voltou a correr, suada e ofegante. Voltou e encostou a cabeça dela à minha. A partir desse instante soube que era minha, minha de verdade, minha de coração, que era o que me importava. E eu, passei a ser também um bocadinho dela.

Acho que com as pessoas é assim também. Só que dá mais medo ainda do que soltar um cavalo.
Mas é assim mesmo. E se não somos nós a soltar, será a pessoa a soltar-se por si.
Se voltar, mesmo que demore, mesmo que diferente, mesmo que ao seu modo... é porque quis, é nosso.
Foi o que disse hoje a uma amiga minha. A teoria é sempre tão fácil...